domingo, 15 de fevereiro de 2009

Democracia à brasileira

Bate-se na tecla da “cidadania”, mas quem no Brasil é cidadão? Fala-se na “preservação das instituições democráticas”, mas quem explica o que são, onde estão? Acho que são abstrações, figuras de linguagem, liberdade poética de políticos e jornalistas, etc. Será que é a urna eletrônica? Será que é o Congresso Nacional, ou o poder Judiciário (que trabalham tanto, coitados)? Será que é “a garantia dos direitos civis”, quando o cara é pobre, preto e não tem grana pra pagar advogado? Será que é o hipnótico plim-plim, em que o país se vê claramente representado? Ou nossa universidade, ativa e em constante comunicação com a sociedade, principalmente no que toca às ciências humanas? Ou nossa polícia, tão bem treinada na defesa dos cidadãos? Vou perguntar pra uma pessoa na rua pra saber o que é... E “liberdade de expressão” existe pra quem? Será que é justo a conta dessa “instituição democrática” ser paga por 90% da população pra ter Diário Gaúcho, Jornal Nacional, Fantástico, Pânico e Big Brother? Tenho dúvidas se esse “pacote” seria vetado em uma ditadura... Não será muito custo pra pouco benefício? O que essa “imprensa livre” oferece no seu cardápio que não seja insosso, papinha de criança? Em que ela ajuda na formação de cidadãos conscientes, críticos, com uma mínima base cultural? Vez por outra ela ainda tenta se desincumbir de seu papel fazendo recair a culpa nos professores, como aquele idiota do Gustavo Ioschpe na Zero Hora. É hilário. Logo o professor, que não tem quase nenhum valor social, que não passa de um operário de ensino, que leva vianda e mofa nos ônibus, que dorme no sofá da escola, que corre pra dois, três, quatro colégios, e que não tem nem tempo de preparar suas aulas direito. Esse débito os russos e cubanos não têm na sua conta há tempos: eram países rurais e atrasados, dominados por latifundiários, e conseguiram acabar com o analfabetismo e dar educação de qualidade à sua população. “São os comunas, cuidado com o que tu vai dizer...” Sim, são comunas, mas seja lá o que for, fizeram o que o Brasil nunca esteve nem perto de fazer. O nível intelectual e cultural da população brasileira é muito baixo, e não se começa nada assim, fica num círculo vicioso que só faz crescer. E vejam: não estou falando da massa de analfabetos. Falo da classe média ignorante, volúvel, que mal se informa, que só lê autoajuda, cujos filhos parasitam as universidades públicas para depois parasitar num emprego público. Falo de nossa “elite intelectual” que nem chega a ter uma formação condizente com sua posição, que escreve livros “práticos” pra ganhar dinheiro e faz filmes de apartamento, idiotamente ambientados no Leblon como se aquela fosse a realidade brasileira. Essa que didatiza e resume tudo de uma maneira inconsistente, falha, pobre. A “classe mérdia”, como Glauber Rocha chamava, a classe que sempre teve medo de perder seus privilégios, de enfrentar o abismo social do Brasil de frente. Sórdida, hipócrita, mais preocupada em manter seu “padrão de vida” e copiar europeus ou americanos do que em prestar atenção à sociedade de que fazem parte, à corrupção e aos governos, à população que crescia sem educação, saúde, moradia nem emprego. Agora ficam trancados em casa trocando emails apavorados com notícias de assaltos no sinal vermelho. Só rindo. Aí aparece o neoliberal brasileiro: assina a Veja, gosta do Arnaldo Jabor e defende o “estado mínimo”, mas na verdade quer mesmo é um emprego bem remunerado no serviço público. Claro, não é (neo)bobo, sabe que o capitalismo que existe no Brasil é uma paródia. Sabe que foi pa(i)trocinado pelo Estado desde sempre, que se abriu todo pro capital estrangeiro nos “anos de ouro” de JK e ditadura militar, e que vendeu estatais na hora de fazer caixa na “era das privatizações” do Collor e FHC. Muita gente se locupletou nesse tempo todo, em geral mamando nas tetas do governo. Daí ser comum esse tipo de vagabundo “com contrato, com gravata e capital que nunca se dá mal” tipo Daniel Dantas, capitalista que adere ao setor estatal pra, na base do lobby, lucrar nas tramóias com gente do governo. O caderninho do cara é tipo coração de mãe, cabe tudo: político, funcionário público, jornalista, empresário, juiz, policial, e vai. Aqui na Tupilândia é assim: os lucros são privados, e as perdas, socializadas. Qualquer problema o “capitalista” tem seguro, o BNDES. Aqui paga-se imposto feito ingles com serviços do Suriname. Democracia, pra mim, é quando o cara reclama do serviço público mal prestado e vê as coisas funcionando no dia seguinte. É fazer a queixa do tratamento “descortês” da abordagem policial e ver o cara responder, saber que tu fez o certo denunciando. É ter os serviços públicos centrados no cidadão, com o rigor da lei em cima pra dar o exemplo. (Isso inclui os políticos, aquela raça repugnante, sórdida, que habita Brasília três vezes por semana, quase todos com o rabo preso, corporativos em sua canalhice.) É ter associações sindicais que não sejam formadas por parasitas, mas uma força política a mais, representando o interesse comum. Uma imprensa menos burra, populista, comodista, menos dada a ser sócia (cúmplice) do poder, que ofereça mais alternativas, mais profunda, mais debatedora de idéias. A verdade é que a população está fora disso, como, aliás, sempre esteve. Historicamente sempre foi tolhida, sufocada, alijada, tida como perigosa. São os “100 milhões de bárbaros” de que fala o intelectual ufrguisiano emergente J. H. Dacanal, que irão destruir a “civilização brasileira” por dentro. Governos e décadas se passaram, o Brasil mudou, as oportunidades foram perdidas. E agora é que eles resolveram se cagar de medo.

6 comentários:

francamenteamigos disse...

É isso aí tchê, diz mesmo, o rei tá peladão!!!! Afinal o que temos a perder criticando-o? Ganhamos tão pouco dele (como tu disseste é muito custo pra pouco benefício), mais morremos de fome, tédio ou neurastênia aceitando placidamente suas medidas.

Juliano

Duda disse...

Amazing, folk.

Um pouco de muito,um muito de nada disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Um pouco de muito,um muito de nada disse...

Pô tive que ler teu texto duas vezes:na primeira tive a exata revolta de qualquer trabalhador.Mas na segunda,com todo perdão ,pois é a primeira vez q nos comunicamos acabei por indignar-me com teu texto.Sim! somente os que tem acesso a boas leituras e como tu mesmo coloca,são poucos, podem ter essa dimensão de revolta.Então te pergunto meu colega,não fazemos parte desta falida classe media que quer tanto ver cidadania por toda parte?Tente responder teus proprios questionamentos.Teu texto esta bem posto,mas a reflexão deve ser ainda mais profunda.Gostei,ainda há quem se revolte."Revoltados do mundo inteiro uni-vos"
Abraços,ha,a proposito,eu curto BBB,hehehehe

Anônimo disse...

Abstracção é realmente tudo aquilo que não existe por si, é parasitário a outro ser. Todas essas instituições que tu citaste são abstracções, bem como sentimentos e a designação de acções. Embora abstractas são ideais reguladores, norteiam nossa construção de um Estado democrático e de direito.
Com todas as falhas do nosso Estado ele ainda é regido por princípios filosóficos importantes ( mais abstracções) como: liberdade, democracia, igualdade, direitos humanos que tais e etc..
Os ideais reguladores dos países que tu citaste passam ao largo da concepção filosófica formadora do Estado brasileiro. A liberdade é suprimida, pois é necessário construir uma ditadura do proletariado, democracia dá lugar a uma centralização do poder e uma ditadura de partido único, a liberdade individual de agir e criar é cerceada.
A tua crítica sobre a cultura de massas no Brasil só faz sentido se pensares que o problema é fundamentado na falta de opção a outro tipo de entretenimento. Os poucos que apontaste, os quais tiveram uma educação melhor, conseguem buscar alternativas.
A chave é realmente na questão educacional, a universalidade já foi alcançada o que falta é atingir qualidade e excelência no ensino público. Como a liberdade é um princípio filosófico do nosso Estado e ideal regulador da nossa sociedade, a partir do momento que as pessoas, principalmente as de menor renda, tenham acesso a essa educação tudo muda: a qualidade da nossa classe política, a qualidade do entretenimento de massas ( bem como a qualidade e variedade da produção cultural em geral). Mas isso só é possível em um Estado democrático de direito. A URSS ruiu, Cuba: sem comentários, gostaria que todos os cubófilos ganhassem uma passagem só de ida para lá.
O que realmente nos falta é uma política educacional séria, universidades que realmente ensinem a ensinar ao invés de ficarem discutindo ideologias mortas e enterradas, tornar atraente a profissão de professor, pegar a gurizada cheia de gás e ideias que está nas licenciaturas e permitir que tenha acesso real aos contratos emergenciais para professor, os quais sabemos que abrem e fecham na calada da da noite professor e só entram os apadrinhados.
mas fora do estado democrático e de direito, fora do capitalismo real que valoriza a livre iniciativa e o mérito pessoal,fora da economia de mercado isso é impossível.

Juliana Ben disse...

É meu amigo... o mar não tá pra peixe. O conceito de cidadania é constantemente deturpado pela mídia e pelas instituições sociais da nossa falida e inerte sociedade. Pra "eles" ser cidadão é cumprir os direitos e os deveres: ser um bom profissional, um bom pai de famílía, pagar os impostos (os mais altos do mundo!) em dia e cumprir as leis, que são ditadas por uma meia dúzia de burocratas que nem ao menos as cumprem. Além de vergonha na cara, falta responsabilidade nesse país, pois a corrupção começa no ato "inofensivo" do funcionário que utiliza o dinheiro público para benefício próprio ao tirar cópias e ususfruir de materiais públicos para fins particulares, e termina nos políticos, que desviam milhões a cada dia, e que, addim, tornam-se o grande e pior exemplo do "jeitinho brasileiro". Mas ainda tenho esperança. Acredito que nós, professores e intelectuais do povo(não ou pouco acadêmicos), temos um papel fundamental para mudar essa situação. E o momento é agora. Há uma certa abertura, já que o ensino de filosofia e ciências socias tornou-se obrigatório e cada vez mais se popularizam essas áreas do conhecimento. Esses dias comprei a revista "Sociologia" e me surpreendi com o seu conteúdo. Além de ser nada acadêmica, os editores parecem preocupar-se em polemizar assuntos que não estão no senso comum e proporcionar conhecimento através de uma linguagem simples e direta.
Bueno, pra finalizar, digo que gostei muito do teu texto. Tu conseguiste fazer um texto politizado, comunista, inteligente e nada panfletário. Viva a boa utilização desse meio de comunicação e expressão advindo da globalização!