sábado, 23 de janeiro de 2010

Antieducação

No dia que a gente quiser ter educação de verdade vamos ter escolas menos parecidas com presídios, salas de aula com menos alunos por turma, equipamentos pedagógicos adequados, profissionais bem formados e com tempo para preparar atividades, podendo avaliar satisfatoriamente o desempenho dos alunos. Formaríamos pessoas com sentido de cidadania, politizadas, críticas, providas de senso ético e estético desenvolvidos, dotadas das ferramentas mentais e emocionais básicas para fazer escolhas e se guiar satisfatoriamente vida afora. Tão aptas a fazer escolhas, que poderiam até, no final das contas, chegar muito perto de uma vida “feliz”.
Mas não é isso que queremos. Queremos uma espécie de recreação para crianças e adolescentes dos 6 aos 17 anos de idade. Queremos decoreba, cola, avaliações que nada avaliam. Queremos salas cheias, com 50 alunos, e que eles permaneçam lá 200 dias por ano A QUALQUER CUSTO presos em suas cadeiras. Queremos mantê-los mínima e mediocremente ocupados, apenas para que não fiquem nas ruas. Como recurso, um giz e um quadro-negro, um professor cansado e sem voz, no terceiro turno de trabalho. Queremos preparar massas indisciplinadas para formar um gigantesco exército de reserva, esperando uma vaga para apertar botões, embalar mercadorias, atender telefones, limpar banheiros e parabrisas, encher tanques, varrer o chão, juntar latinhas, adestrar cães, enfim, receber baixíssimos salários, cidadãos de segunda categoria. Assim, quanto aos “governos”, ninguém pode dizer que não cumpriram suas obrigações legais. Eles “dão” educação. Ninguém se pergunta se a questão é “de que tipo”. E a cota do professor? Ah, sim, ele também é responsável. Mas não muito. Muitos são pobres coitados que mal conseguiram completar a metade de seu curso, que mal conhecem as disciplinas que tentarão em vão ensinar. O “coitadismo” está disseminado entre a classe e é abominável, inútil. Muitos professores entram na sala de aula com a autoestima na sola do sapato, como gado entrando no brete, omissos. “We don´t need this education”. Ninguém precisa. Mas é essa a educação que queremos. E só.

Um comentário:

E. Simon disse...

"Tão aptas a fazer escolhas, que poderiam até, no final das contas, chegar muito perto de uma vida “feliz”. "
Genial! Já conhecia o texto, mas o reli e foi emocionante como da primeira vez, socos no estômago da primeira à última letra, acidamente críticos, mas permeados por, como diria um velho amigo, uma "cosmovisão solidária". Abração